O desfazer do Presépio
Eu não sei de nada mais triste do que o terminar de todas as festas. Em criança arrasavam-se-me de água os olhos quando assistia ao desfazer do presépio que, em honra do Menino Deus, se armava em minha casa pelo Natal.
Cerrava-se-me o coração de melancolia, ao ver guardar outra vez na arca – e por um ano! – o Menino, Nossa Senhora e S. José, os grupos dos pastores, a vaca, o jumento, os três reis, os anjos e todos os mais acessórios do pitoresco santuário, diante do qual, nesses quinze dias, se rezava a coroa em família e se cantavam as loas da ocasião! Amargo dia de Reis, último desta abençoada quinzena, já te não via assomar sem que se me enevoassem aquelas puras alegrias infantis. Que não encontrásseis mais estorvos pelo caminho, venerandos Magos! Que aquela milagrosa estrela, que vos trouxe a Belém, vos não fizesse errar mais tempo antes de lá chegardes! Fatal 6 de Janeiro! Com o teu anoitecer, anoitecia-me o coração. Voltava a vida normal, voltavam os bancos das aulas, a aritmética, caligrafia, oh! A caligrafia sobretudo tão associada à férula do mestre-escola! E o que era pior que o mais – acabava aquela santa comunidade em que durante quinze dias vira a família; o lar doméstico já não oferecia o alegre tumulto e desordem, em que velhos e crianças tomavam parte, esse ruído e confusão que tão fundo calava no coração de todos. A solenidade que nos reunira sob o mesmo tecto, que nos fizera viver a mesma vida, ia acabar.
Nós, as crianças, chorávamos às claras na despedida; mas suspeitávamos de que as nossas lágrimas tinham companheiras envergonhadas. Quantas vezes surpreendíamos segredos de comoção que nos redobrava o choro!
Cerrava-se-me o coração de melancolia, ao ver guardar outra vez na arca – e por um ano! – o Menino, Nossa Senhora e S. José, os grupos dos pastores, a vaca, o jumento, os três reis, os anjos e todos os mais acessórios do pitoresco santuário, diante do qual, nesses quinze dias, se rezava a coroa em família e se cantavam as loas da ocasião! Amargo dia de Reis, último desta abençoada quinzena, já te não via assomar sem que se me enevoassem aquelas puras alegrias infantis. Que não encontrásseis mais estorvos pelo caminho, venerandos Magos! Que aquela milagrosa estrela, que vos trouxe a Belém, vos não fizesse errar mais tempo antes de lá chegardes! Fatal 6 de Janeiro! Com o teu anoitecer, anoitecia-me o coração. Voltava a vida normal, voltavam os bancos das aulas, a aritmética, caligrafia, oh! A caligrafia sobretudo tão associada à férula do mestre-escola! E o que era pior que o mais – acabava aquela santa comunidade em que durante quinze dias vira a família; o lar doméstico já não oferecia o alegre tumulto e desordem, em que velhos e crianças tomavam parte, esse ruído e confusão que tão fundo calava no coração de todos. A solenidade que nos reunira sob o mesmo tecto, que nos fizera viver a mesma vida, ia acabar.
Nós, as crianças, chorávamos às claras na despedida; mas suspeitávamos de que as nossas lágrimas tinham companheiras envergonhadas. Quantas vezes surpreendíamos segredos de comoção que nos redobrava o choro!
Júlio Dinis, Serões da Província
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